348 votos a favor, 274 contrários e 26 abstenções. Foi com esse resultado que o Parlamento Europeu aprovou, nesta terça-feira (26), o polêmico Artigo 13, que faz parte do projeto de reforma das leis de direitos autorais na União Europeia que pode ter grande impacto na web como um todo. Impacto negativo, tanto que o momento atual é de enorme apreensão.
Por que o Artigo 13 é tão preocupante?
Apresentado em 2016, o Artigo 13 figura como um dos pontos mais controversos da proposta de reforma de direitos autorais da União Europeia. Isso porque, do modo como foi proposto, o projeto pode acabar até servindo como mecanismo de censura na internet, entre outros problemas.
Essencialmente, o artigo 13 determina que todas as plataformas online de compartilhamento ou distribuição de conteúdo, não importa de que tipo (áudio, vídeo, texto ou imagem), apliquem filtros de copyright para verificar se direitos autorais não estão sendo violados.
O conteúdo deverá ser bloqueado caso as permissões para publicação ou divulgação não sejam comprovadas, do contrário, a plataforma poderá ser responsabilizada. Isso significa que serviços como Facebook, Instagram, Twitter e YouTube poderão ser obrigados a ter um controle bastante rígido sobre o que os usuários publicam.
Não é por acaso que diversas companhias de internet, figuras políticas e personalidades importantes como Tim Berners-Lee, Vint Cerf e Jimmy Wales promoveram discursos e campanhas nos últimos meses para derrubar o Artigo 13.
Mas, como sabemos agora, a mobilização não foi suficiente para convencer majoritariamente o Parlamento Europeu. Julia Reda, parlamentar que representa o Partido Pirata e uma das vozes mais ativas contra a reforma, classificou esta terça-feira como um “dia negro para a liberdade na internet”:
Dark day for internet freedom: The @Europarl_EN has rubber-stamped copyright reform including #Article13 and #Article11. MEPs refused to even consider amendments. The results of the final vote: 348 in favor, 274 against #SaveYourInternet pic.twitter.com/8bHaPEEUk3
— Julia Reda (@Senficon) 26 de março de 2019
Quando o assunto começou a ganhar força na web, no ano passado, dizia-se que o projeto poderia acabar até com os memes. Mas o Artigo 13, agora integrado ao Artigo 17 da proposta (o nome Artigo 13 continua sendo usado apenas por conveniência), não vai afetar conteúdos com citações, críticas, caricaturas ou paródias, o que significa que os memes estão, em princípio, protegidos.
Porém, o Artigo 13 não deixa de ser menos controverso por conta disso. O projeto foi promovido como uma iniciativa para dar a editores de conteúdo, artistas e detentores de direitos autorais em geral mais controle sobre como plataformas online lidam com seus trabalhos e lucram com isso, direta ou indiretamente.
Mas teme-se que o efeito seja justamente o contrário, ou seja, que os filtros sejam tão restritivos que editores e artistas tenham dificuldades para publicar seus trabalhos na web ou mesmo sejam impedidos de algum jeito de fazê-lo.
Um exemplo hipotético: um vídeo no YouTube que contém pequenos trechos de filmes ou capturas de jogos de videogame pode simplesmente ser bloqueado na plataforma por ter não obtido autorização direta para utilizar esse material.
Da mesma forma, pode ficar mais difícil para um cantor divulgar a sua própria música nas redes sociais: os filtros ainda não são precisos e, na dúvida, é melhor para as plataformas exagerar na moderação do que deixar algum conteúdo compatível com as restrições passar.
De modo resumido, o cenário tende a ser tão sufocante que poderá afetar diretamente a liberdade de expressão. Pode parecer exagero, mas o temor não é desmedido: o comportamento padrão vai ser o de bloquear primeiro, analisar depois.
O que acontece daqui para frente?
As mudanças não são imediatas. O texto ainda precisa ser aprovado pelo Conselho da União Europeia. Depois disso, cada país que compõe o bloco terá dois anos para aprovar uma legislação compatível com a reforma. Essa “guerra” ainda não está perdida, portanto.
O maior problema é que as principais plataformas online foram desenvolvidas para serem globais e, com efeito, terão dificuldades para oferecer seus serviços seguindo as restrições impostas por cada país da União Europeia.
A possível consequência disso é que as companhias optarão por aplicar filtros que atendam a todas as legislações, de modo que até os usuários de países com leis mais flexíveis sejam submetidos a um rigor exagerado. Por conta da natureza global das maiores plataformas online, até países que não compõem a União Europeia poderão ser afetados.
Plataformas menores, como as que são mantidas por startups, também poderão ser fortemente impactadas, embora o texto preveja que empresas com receita inferior a € 10 milhões anuais ou menos de 5 milhões de usuários por mês ou, ainda, que estejam ativas há menos de três anos, não tenham que se submeter às mesmas regras.
Mesmo assim, existe o risco de que a concentração de conteúdo em plataformas de companhias como Google e Facebook aumente, afinal, os grandes players é terão mais condições de arcar com as restrições.
Mas, apesar de a recente votação do Parlamento Europeu ter sido favorável à proposta, ainda é possível fazer oposição. Nas redes sociais, a hashtag #SaveYourInternet continua sendo usado para esse fim.
Vale destacar que no meio dessa polêmica também está a aprovação do Artigo 11 — agora chamado de Artigo 15 —, que determina que plataformas online paguem uma espécie de taxa para divulgar links para notícias com pequenos trechos destas. O texto do Artigo 11 foi flexibilizado nos últimos meses, mas essa diretiva ainda pode tornar serviços como Google News inviáveis.
Fonte: Tecnoblog